Você tem algumas das marcas de verdadeira piedade sobre você e, pelo menos, pode juntar-se a alguns dos sentimentos que temos citado, mas ainda assim teme que o seu coração não seja reto para com Cristo. Qual é o motivo de tal suspeita? Você responde que o seu excesso de apego aos seus amigos e familiares é prova de que você não é sincero, pois, se você amasse a Jesus verdadeiramente, O amaria mais do que a esses. Você fala sobre a sua queixa do seguinte modo: "Eu temo que amo a criatura mais do que a Cristo, e, se assim for, meu amor é hipócrita. Frequentemente sinto afetos mais veementes e mais ardentes do meu coração para com os meus amados parentes do que para com os objetos celestiais, e por isso acredito que ainda sou carnal e que o amor de Deus não habita em meu coração".
Longe de nós esteja defender a causa do pecado ou diminuir a indubitável culpa se você age assim; mas, ao mesmo tempo, estaria ainda mais longe do nosso propósito apagar prontamente todos os nomes da família de Deus. Pois, se nosso amor deve ser medido por seu ímpeto temporário, tememos que não exista um entre os santos que não tenha, em algum momento ou outro, um amor excessivo à criatura e que não poderia ser, assim, um hipócrita. Lembremo-nos, portanto, de que a força da afeição deve ser medida mais pela força que ela tem sobre o coração do que pelo calor que ela exibe em situações e épocas ocasionais. Flavel observa com muita sabedoria:
Enquanto a malícia enraizada defende um ódio mais forte do que uma paixão súbita, ainda que mais violenta, assim devemos medir o nosso amor, não por um movimento violento e ocasional, mas pela profundidade da raiz e pela constância de sua atuação. Como Davi amava Absalão, Joabe concluiu que, se ele tivesse vivido, e todo o povo tivesse morrido, isso teria agradado ao rei; mas isso foi argumentado mais como um soldado do que como um lógico.
Se o seu amor for constante em suas manifestações, fiel em seus atos e honesto em seu caráter, você não precisa desconfiar dele por causa de determinadas paixões que temporária e perversamente inflamam a mente. Evite essas paixões por serem pecaminosas, mas não duvide da veracidade de sua afeição por seu Mestre. A verdadeira graça pode estar na alma sem ser aparente, pois, como Richard Baxter observa verdadeiramente: "A graça nunca é aparente e sensível à alma, senão enquanto está em ação". O fogo pode estar na pederneira, e ainda não ser visto, exceto quando a ocasião o fizer se manifestar.
Extraído do livro O Santo e Seu Salvador de Charles Haddon Spurgeon